Trinta anos depois, o Caderno de Sábado do Correio do Povo volto a circular. Ícone do jornalismo cultural do Rio Grande do Sul, o Caderno de Sábado teve sua trajetória interrompida junto com o próprio jornal, que, em 1984, ainda sob o comando da família Caldas, não resistiu à grave crise financeira e decretou falência. O impresso mais antigo de Porto Alegre mudou de mãos duas vezes, desde o fechamento, nos anos 80. Reabriu em 1986, com o empresário Renato Ribeiro. Em 2007, a companhia jornalística foi adquirida pelo Grupo Record.
Só agora, no entanto, o Caderno de Sábado, a referência cultural e literária dos anos 60 e 70 no Estado, voltou a entrar em circulação. Retomado sob a coordenação editorial de Juremir Machado da Silva, jornalista e professor da Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da PUCRS, e com edição de Luiz Gonzaga Lopes, o suplemento está novamente disponível desde 1º de março.
Juremir falou sobre a nova jornada do Caderno de Sábado em entrevista ao Espaço Experiência:
EE – Por que o Caderno de Sábado está retornando agora?
J – O caderno foi uma espécie de instituição cultural do Estado. Marcou época. Ajudou a formar leitores e grandes escritores. Os maiores escritores gaúchos passaram por lá, como Erico Verissimo e Mario Quintana. Era sempre reinvidicado pelos leitores. Sempre ouvíamos deles “quando o caderno vai voltar?”, como uma espécie de lamento, saudades do caderno. Depois que o Correio fechou sob o comando da família Caldas, o jornal mudou muito, ganhou novos formatos, um menor número de páginas. Então, não tinha muito jeito de retomar o caderno. Apenas agora, nessa terceira fase do Correio, sob o comando da Rede Record, surgiram as condições.
EE – Quais condições?
J – Precisávamos de um patrocínio forte. Hoje, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul aceitou patrocinar o caderno.
EE – Mas o que motivou esse retorno?
J – A base para esse retorno foi o desejo dos leitores, de quem trabalha no jornal, que sempre sonhava com a volta do caderno, e de um patrocinador forte.
EE – Qual a proposta editoria do novo caderno?
J – A proposta é remagnetizar a comunidade cultural, trazendo velhos colaboradores, como Antônio Hohlfeldt, Sérgio Farah e outros. Fazer uma nova aventura na contramão da maioria dos jornais que vem fechando seus suplementos culturais. Pretendemos trazer um caderno ágil, leve, dinâmico, adequado a nosso tempo, com bons temas, textos interessantes de serem lidos e com um pouco de polêmica.
EE – Quais as diferenças para o antigo caderno?
J – Várias. Primeiramente, pelo tamanho dos textos, que hoje é de quatro a cinco mil caracteres. Antes, o caderno era bem literário, publicava-se muita poesias e contos e menos análises. Agora, queremos textos com profundidade, mas, ao mesmo tempo, leves. Hoje, a nossa base é um caderno de cultura que se comenta o fazer cultural, um caderno analítico mas ágil, agradável de ser lido, hipermoderno, com tempero. Temos de quatro a cinco páginas livres para cultura, agenda, roteiro e tudo mais. Ainda vamos trazer de volta as entrevistas pingue-pongue.
EE – Qual é o público do caderno?
J – Temos um público da época do antigo Caderno de Sábado, aquele cativo do Correio. Mas também buscamos o público jovem. Quando o Caderno de Sábado esteve no seu auge, a comunicação era feita de outra forma. As atenções estavam concentradas nos jornais impressos. Hoje, a concorrência é enorme e não podemos ignorar esse contexto atual muito mais amplo. É um desafio muito maior fazer um caderno de cultura hoje, inclusive para fazer uma crítica.
EE – Como o sr. avalia o leitor de cultura no Brasil?
J – Em quase todo lugar é um leitor minoritário, inteligente, com informação e exigente, o que não quer dizer que ele seja superior. É um tipo de leitor que gosta de ir a uma exposição, de ir ao cinema e que gosta de ler. Uma pessoa para quem a leitura não seja um peso, mas um prazer. Vejo isso como uma segmentação, um tipo de leitor mais específico, que seja mais interessado nesta área.
EE – É possível adiantar alguns temas que serão tratados no Caderno de Sábado?
J – A nossa base é um caderno de cultura, em que comenta o fazer cultural, falamos de cinema, de literatura, um caderno de crítica, exame. A primeira edição foi sobre cinema, com textos em torno do filme 12 Anos de Escravidão, aproveitando o gancho do Oscar. Vamos publicar material em torno do Dia da Mulher, dos 50 anos do Golpe Militar, dos 100 anos da Primeira Guerra Mundial e dos 150 anos da Guerra do Paraguai. Essas efemérides é que vão nos permitir falar, analisar, relembrar, elogiar. Mas nosso espaço também é o espaço do comentário, da discussão. E da polêmica.