Existem momentos que marcam a vida de alguém. É assim no primeiro beijo, no primeiro amor, no primeiro dia de aula, no primeiro emprego e no primeiro anúncio publicado em um jornal impresso. E, claro, nada poderia ser mais surpreendente do que a grande repercussão de um conto que parodia um anúncio, produzido especialmente para um trabalho de pós-graduação.
Através da junção da linguagem literária e a dos classificados, o professor do curso de Publicidade e Propaganda da Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da PUCRS Samir Arrage, 32 anos, conquistou o coração de inúmeros leitores que compartilhavam de sua suposta dor. O texto, veiculado no Jornal Zero Hora, conta a história de um homem que foi rejeitado por uma mulher e, por essa razão, precisou vender o anel de noivado.
Como parte de uma atividade final do 1˚ semestre de mestrado em Escrita Criativa pela Faculdade de Letras (FALE) da Universidade, Arrage produziu cinco minicontos que misturam elementos da publicidade e da literatura. O texto Ela disse não, único a ser publicado, foi inspirado em obra do autor Ernest Hemingway e na relação com a publicidade.
O trabalho foi além do esperado. O objetivo era apenas receber um e-mail para anexar à atividade entregue nesta quarta-feira (22) para o seu professor Ricardo Barberena, da disciplina de Literatura Comparada. Entretanto, Arrage foi surpreendido, até a última segunda-feira (20), por mais de 900 recados. A repercussão ultrapassou as fronteiras do Rio Grande do Sul e do Brasil. “Uma amiga minha ouviu comentários sobre meu conto em Fortaleza. Fiquei espantado”, ressalta. Apesar de não ter lido todos seus e-mails, o docente conferiu alguns e descobriu que também foram enviados do outro lado do Oceano Atlântico. “Recebi mensagens até mesmo de brasileiros que moram em Londres”, celebra.
Casado há 12 anos, o publicitário diz que não se inspirou em sua vida para realização do anúncio. “Muito pelo contrário”, diz. Diferente da história retratada no jornal, ele e a esposa, Mayume Hausen Mizoguchi, tem uma relação de cumplicidade e aguardam a chegada do pequeno filho Tom.
O Jornal Zero Hora disse sim e publicou o anúncio que viria a se tornar um assuntos dos mais comentados da semana. Veja o texto na íntegra, no dia 16 de junho:
ELA DISSE NÃO
VENDE-SE anel de ouro 18k c/ brilhante, s/ uso, única (possível) dona declinou. Acendi velas, forrei o piso c/ pétalas (vermelho metálico) preparei talharim à carbonara (receita copiada da internet). Operei o saca-rolhas, servi 2 taças com malbec (argentino). Jazz (instrumental/americano) ao fundo. Antes da sobremesa: encostei joelho (direito) no piso soterrado por flores. Destampei o casulo aveludado. Proposta feita. Ao que parece, oportunidade única, p/ ela, nunca foi. Lacrimejou/berrou/culpou a rotina (1 clichê). C/ apenas 8 meses de uso, fui substituído por 1 rapazote 0km. 1 estagiário de Direito, 23 anos (revisado em rede social). Colega de trabalho, mais potência, 6 gomos no abdômen. Em péssimo estado, busco, ao menos, recompensa financeira. Voltei a fumar (clichê, 2). Bem que mamãe (falecida, 3 anos) sempre avisava: as coisas do coração não têm pisca-pisca. Enfim, negocia-se. Aceitamos ofertas/trocas/ombro amigo e histórias a combinar c/ essa. Envie p/: eladissenao@gmail.com